segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Transhumanismo- H+

 

"Transhumanismo é um movimento intelectual que visa transformar a condição humana através do desenvolvimento de tecnologias amplamente disponíveis para aumentar consideravelmente as capacidades intelectuais, físicas e psicológicas humanas. "
Wikipédia
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Página do Facebook do movimento
Transhumanismo no Brasil



https://www.facebook.com/pg/transhumanismobr/about/


Leia mais :
http://danizudo.blogspot.com.br/2010/12/agenda-transhumanista-o-porque-de.html
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Mas afinal o que é o transhumanismo? E quem são os transhumanistas?
Parte do texto publicado  em 18 de Maio de 2017 no  Jornal MAPA de Informaçao Crítica 
 
 
O mundo não tem sido feito por amor dos seres humano e não se tornou mais humano
Herbert Marcuse(1)


O H+ é, em poucas palavras, um movimento que procura ultrapassar deliberadamente, com meios científicos e tecnológicos, os limites da condição biológica do ser humano e, em última análise, almeja alcançar a imortalidade terrena.

A adjetivação “terrena” serve para expressar o aspecto mundano e laico desta nova figura da mais antiga inquietação humana.

Da Epopeia de Gilgamesh e do terceiro milénio antes de Cristo, à pratica da mumificação dos egípcios, do pensamento taoista à alquimia esotérica, o H+ considera-se o legítimo herdeiro dos esforços históricos da humanidade para ganhar o seu jogo de xadrez com a morte.

Nesse sentido, os teóricos do H+ interpretam a tecno-revolução em curso e por vir como o resultado cumulativo de um processo histórico contínuo.


O ser humano seria desde sempre um animal insatisfeito consigo próprio, em luta com a frágil condição que lhe foi dada e, portanto, sempre à procura do potenciamento das suas capacidades psicossomáticas. Se a recusa da animalidade inscrita na condição humana teve nas religiões o seu desafogo, o H+ seria então a resposta laica às aspirações escatológicas das religiões tradicionais.


Na perspectiva do Nick Bostrom, docente em Oxford e um dos líderes deste movimento, o H+ é a expressão contemporânea do humanismo renascentista – exemplificado por Giovanni Pico della Mirandola (1463-1494), para o qual o indivíduo deve ser um livre criador de si próprio, atingindo “formas mais altas, divinas” – do projeto prometeico da ciência empírica – entendida no Novum Organum do Francis Bacon (1561-1626), como o método para “tornar tudo possível” através da submissão da natureza aos fins humanos – ou ainda do racionalismo da idade das luzes.(



A estratégia discursiva com a qual Bostrom persegue a hegemonia cultural do H+ enxerta-o na tradição racionalista e no utilitarismo anglo-americano, visando acentuar a natureza democrática e liberal da reivindicação do direito incondicional à auto-determinação psicossomática, tentando desajeitadamente demarcar-se dos fantasmas da eugénica do século XX.


Por outro lado, o norueguês Stefan Lorenz Sorgner assimila o “potenciamento tecnológico”, tanto genético como de outros tipos, ao impulso de auto-melhoramento e ao “sentimento da potência que cresce”, caros para Nietzsche.


Outro defensor desta filiação é Max More, que conta como o seu ensaio Tranhumanism: Towards a Futurist Philosophy (2009), tendo sido inspirado pelos seus estudos do pensamento do Nietzsche.(4) No entender de More, fundador de orientação anarco-capitalista do Extropy Institute, o H+ é um conjunto de filosofias heterogéneas que nos guiarão até à condição pós-humana.



Mas se quisermos fazer uma aproximação ao H+, será porventura necessário fazer algum desvio das narrativas na primeira pessoa dos protagonistas contemporâneos, dando preferência a um itinerário histórico, social e cultural ziguezagueante.



O primeiro desvio conduz-nos aos tempos da Primeira Revolução Industrial e a uma das primeiras fases da construção de um ideal de tecnociência como fator de progresso e de emancipação: o pensamento do Saint-Simon (1760-1825) e a sua influência na Escola Politécnica de Paris.


Eis algumas das pérolas do profético pensador da “sociedade industrial”: “Uma nação não é senão uma grande empresa industrial»; «A sociedade moderna só tem um objectivo: a produção, a indústria»; «O trabalho, eis o novo culto, a religião moderna» e o engenheiro é «o sacerdote da indústria».

Tendo em conta que hoje em dia não é raro encontrar, confundidas na mesma pessoa, a figura do cientista, do engenheiro, do empreendedor e do consulente de instituições governamentais,( também a previsão do Auguste Comte, no seu Cours de philosophie positive (1830-1842), parece ter sido cumprida. Pois ele intuiu que os engenheiros iriam ter um papel histórico preeminente: o de serem os mediadores entre os savants e os entrepreneurs, entre ciência e economia industrial.


O saint-simonismo está nas origens da retórica do mundo como uma rede e como um espaço de fluxos, uma economia-mundo articulada em circuitos sempre mais densos, amplos e homogéneos, circuitos capazes de aumentar a circulação de bens materiais e imateriais: produtos, informações, pessoas e capitais.


Daí o seu entusiasmo tecno-optimista quanto à construção de estradas, pontes e canais que levariam à “associação universal”, à comunhão entre os povos e à paz perpétua

Parece que ouvimos os motivos saint-simonianos ressoar nas intenções e nos discursos dos criadores da Internet, vista como uma ferramenta para a descentralização e a desierarquização das relações sociais.


Apesar das questões e das dúvidas que se podem levantar acerca do potencial emancipador das tecnologias digitais, e apesar das denúncias dos seus impactos psicológicos, políticos, econômicos, sociais e ecológicos, continuam a florescer varias versões de “utopismo digital” inspirado pelo conceito de reticularidade. É um fato que a Califórnia é parte do mundo à qual mais se deve a revolução social que estamos vivendo, a saber, a invasão tentacular das tecnologias informáticas em todas as esferas da existência humana.


A transformação em curso dos modos de viver e de pensar têm as suas raízes na California Ideology,isto é, na hibridação dos fatores culturais mais variados, desde a contracultura comunitarista dos anos ’60 ao neoliberalismo – que resultou no oxímoro do “anarco-capitalismo”.(


A Silicon Valley pode ser chamada a terra santa, o epicentro mundial do H+, pois é a partir daí que operam muitos dos profetas-empreendedores-cientistas do H+ e as suas instituições: World Transhumanist
Association, Singularity University, Google, Facebook, PayPal…
Mas convém regressar ao tempo de Saint-Simon e de Comte, quando as lutas dos luditas estouraram como movimento operário organizado, levando ao acrescento do crime de destruição de máquinas aos já mais de cem crimes passíveis de pena de morte na jurisdição inglesa. 

A revolta dos artistas das “artes menores” face à grande inovação da altura, o tear mecânico, foi silenciada. Marx afirmara em O Capital (Liv. I, Sec. IV, Cap. 13) que “A história universal não oferece espetáculo mais horrendo do que a extinção dos artesãos tecelões de algodão ingleses […], muitos morreram de fome”, enquanto que nas colónias “os ossos dos tecelões de algodão embranquecem as planície indianas”. 


A sua análise levou-o a concluir que, sob o capitalismo, “o efeito ‘temporário’ das máquinas é permanente, uma vez que se vai apropriando de cada vez mais campos de produção”. 

Entre máquinas e operários há, portanto, “um antagonismo completo”. Visto que “o meio de trabalho esmaga o operário”, “dá-se pela primeira vez a revolta brutal do operário contra o meio de trabalho”. 
Apesar disso, Marx será sempre um tecno-progressista (TechnoProg), pois, segundo ele, a “socialização” dos meios de produção teria remediado todos os estragos devido ao estranhamento do produto do trabalho face ao seu realizador. 
Friedrich Engels, de resto, cristalizou a atitude centralista e autoritária do materialismo dialético ao escrever em On Authority  que a máquina a vapor, a rede rodoviária, e, em geral, a agricultura e a indústria em larga escala, são intrinsecamente autoritárias e é preciso aceitá-las, pois combater esse autoritarismo coincidiria com a pretensão de abolir a indústria enquanto tal, coisa que, como é óbvio, para ele não fazia sentido. 

A “questão da maquinaria” foi, de qualquer forma, um tema muito debatido pelos economistas da altura, e as suas implicações humanas estavam ao alcance de cada um.(12) É, alias, bem provável que Marx e Engels conhecessem The Philosophy of Manufactures (1835), de Andrew Ure, uma declaração de intenção (de guerra) que frisava como, além das vantagens quantitativas e técnicas, um dos benefícios “morais” da introdução da maquinaria residia na desqualificação do trabalhador, o que, por sua vez, era suposto induzir desânimo no trabalhador, levando ao abrandamento das greves. 

Todos sabemos o quão sangrentas foram as lutas das décadas sucessivas. Anos também notáveis pelas exposições universais (a primeira, em Londres em 1851, chamava-se Great Exhibition of the Works of Industry of All Nations) e pela aceleração dos ritmos de exploração e manipulação do existente, finalmente reduzido a recurso.

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