Sobre
resistir, sobreviver e recomeçar
E sobre minha releitura.
E sobre minha releitura.
15 de abril de 1941. O mundo
de Agnès Humbert (Dieppe, 1894 - Paris 1963) ia bem, apesar da falta de
notícias dos colegas judeus do Musée de l’Homme (em frente à Torre Eiffel) e
dos abusos de poder por parte dos alemães invasores.
Ela escrevia um diário e já
conspirava. O local dos encontros do grupo de resistentes era a Closerie de Lilás, em Montparnasse.
Em março, o grupo começou a
se dissolver e em abril, Agnès interrompeu a narrativa por ter sido presa..
“ Resistência",
no original “Notre Guerre’’
Editions Paul Frères -1946, foi
relançado em ótima hora pela Nova Fronteira
( 2008, tradução de Regina Lyra).
Uma vez que comecei, não deu
para parar : li a segunda vez e a terceira.E esta agora, 3 anos depois. É uma fonte inesgotável de coragem,
exemplo de vida e – mesmo - de História Contemporânea. E um alívio para horas
de sofrimento - quando a gente pensa que está passando por alguns problemas,
basta ler Agnès Humbert para que a
situação seja vista com a devida dimensão.
Sempre admirei a figura
fortíssima de minha Oma (avó) paterna, que serviu por 3 anos e meio como
escrava num único local de martírio: o campo de trabalhos forçados em
Teresienstad, na atual República Tcheca, trazendo no pulso -até a morte - a
marca de ser judia - um número gravado a ferro,
Eu a conheci aos nove anos a
revi adulta, e pude visitá-la com certa freqüência até que morreu com quase 90 anos,
lendo sem óculos. A resistente Oma sobreviveu
e retomou sua lojinha de tecidos na Rathaus Platz, em Münden,
cidadezinha medieval que ficou imune aos bombardeios aliados.
A trajetória de Agnés Humbert
foi outra. Perambulou por várias prisões coletivas, e celas solitárias até junho de 1945, quando os americanos
entraram em Wanfred e a libertaram tão magra que era chamada de “Ghandi”.
Estava quase cega pelas
emanações de gases na Fábrica Phrix, em Krefeld, onde manipulava, sem luvas,
ácido e viscose para produção de seda sintética. A descrição dos sofrimentos
causados pelo sulfeto de carbono na pele sem proteção é de arrepiar. Ela relata
que brincava com varetas feitas de palha do colchão onde dormia e com uma bola
feita de lã do cobertor e que as unhas ficaram tão crescidas que viraram armas.
E que, durante dois meses, ficou com a
mesma roupa e sem banho. A roupa limpa
chegou em julho de 1942
Agnés Humbert, intelectual,
historiadora da Arte, especialista em
folclore, com inegáveis
qualidades de liderança era mulher coerente.
Agnés Humbert |
Terminada a guerra, não quís
retomar o posto no Musée de l’Homme - de onde
seu grupo de amigos saiu para não voltar e onde foram impressas 4
edições do jornal “Resistência”.
Com Jean Cassou - companheiro
de resistência sobrevivente - trabalhou no
Musée d’Art Décoratif de Paris, criado em 1947.
A palavra “resistência”, no caso de Agnès Humbert, tem duplo significado. Ela desafiou um regime sanguinário pela força de vontade e determinação e sobreviveu com problemas de saúde, mas dignamente. Foi condecorada com a Cruz de Guerra em 1949.
Uma característica interessante do livro “Resistência” é o fato do diário ter sido escrito em dois tempos: em 1941 e , de memória, a partir do dia seguinte à sua libertação pelas tropas americanas. Para que tudo ficasse fixado, sem as formas meio enfumaçadas que os acontecimentos costumam tomar no futuro, quando vistos com a perspectiva de “passado”.
E antes que o natural
instinto de sobrevivência apague o lado negativo da situação.
Após a guerra, passou morar
com o filho Pierre Sabbag que se tornou
famosíssimo apresentador na tv na França.Pierre era fruto do casamento com
o artista George Sabbagh .
As seqüelas do sofrimento não
a deixaram em paz, mas Agnès continuou escrevendo seus livros até morrer em
1963.
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