domingo, 19 de dezembro de 2010

W.H.Auden- a voz de uma geração

Quatro Movimentos & uma Elegia



Na cena final de "Quatro Casamentos & Um Funeral” - um dos filmes britânicos de maior sucesso até hoje (mais de 260 milhões de dólares de bilheteria) - o poema lido é "Funeral Blues" de autoria de W.H. Auden,sempre citado como um dos mais importantes intelectuais ingleses do século XX , primeiro grande poeta moderno a incorporar paradigmas, reflexões e insights psicanalíticos em seus trabalhos. 


Primeiro Movimento

Wystan Hugh Auden nasceu em York ,Inglaterra(21/2/1907), em família da alta classe média, terceiro filho de um médico sanitarista e de uma enfermeira, de quem herdou o interesse pela música, religião e a paixão pelas sagas norueguesas.
Viveu em Harborne até os oito anos e, quando seu pai, o Dr. George Auden, passou a lecionar em Birmingham, Auden foi enviado a colégios internos, mas sempre retornava ao carinho do lar nas férias e feriados.
Os estudos complementares foram feitos na Christ Church, da Universidade de Oxford.


Em 1921, freqüentemente fazia companhia aos pais em Keswick, na Cumbria e cerca de 40 poemas e duas peças foram gestados nestas montanhas entre os quais a epifânia (representação literária da natureza essencial de algo) de 1922, onde assume sua criatividade artística através de uma metáfora.


Depois de Oxford, viveu um ano na Berlim da República de Weimar onde a atmosfera tolerante ajudou a consollidar a segurança com que exprimia sua oriaentação sexual e a absorção da cultura germânica
Voltou para ensinar em escolas públicas na Escócia e na Inglaterra, de 1930 a 1935.

Os 3 anos passados na Downs School, perto de Great Malvern, foram os mais férteis da primeira fase de seu trabalho.


Segundo Movimento

Até 1931, participou de um grupo de ecritores talentosos como Edward Upward, Christopher Isherwood, Louis MacNeice, Cecil Day-Lewis e Stephen Spender.

 Em 1935, Auden protagonizou um declarado casamento de mentirinha com Erika Mann, a filha lésbica do grande escritor alemão Thomas Mann.
O objetivo era oferecer um passaporte inglês para que a atriz de “Senhoritas de Uniforme “ e “inimiga pública do Terceiro Reich” pudesse escapar das perseguições nazistas.
O “casal” nunca viveu junto, mas permaneceu amigo e nunca se divorciou.

Em janeiro de 1939, desiludido com os rumos que a esquerda inglesa havia tomado, emigrou para os Estados Unidos com o amigo e colaborador Christopher Isherwood.

 Esta saída de cena, logo no começo da 2a. Guerra Mundial, foi interpretada por admiradores e críticos como uma traição.
Uma das primeiras atividades nos Estados Unidos foi fazer uma leitura pública de poemas. Neste evento encontrou pela primeira vez o jovem poeta de 18 anos Chester Kallman, nascido no Brooklyn, com quem se relacionaria por dois anos. A relação não inteiramente feliz devido às infidelidades de Kallman, deu ao poeta companheirismo que o ajudou a manter a serenidade no auto-exílio e inspirou uma série de poemas eróticos.


Kallmann também reativou o interesse pela ópera, o que deu nova forma à carreira de Auden. Ambos trabalharam em conjunto em diversos libretos ,dois para Hans Werner Henze, um para Igor Stravinsky ,outro para Benjamin Britten.
 

Dois egos inflados não podiam compartilhar uma relação amorosa, mas continuariam amigos queridos, inclusive alugando juntos casas e apartamentos até a morte de Auden.



Terceiro Movimento

A interdependência entre EROS - o amor cego, egocêntrico, inconstante e explosivo, amor-desejo - e AGAPE - livre, fiel, compassivo, amor-doação - é a semente do considerado mais belo poema de amor do século 20, "Lullaby" ("Lay your sleeping head",de 1937).
Outros trabalhos relevantes são um oratório de Natal, For the Time Being, os poemas "The Unknown Citizen", "Musée des Beaux-Arts", e os produzidos especialmente para as mortes de William Butler Yeats e Sigmund Freud.


Um Auden engajado escreveu "Spain", poema sobre a Guerra Civil Espanhola e “1º de Setembro de 1939”, sobre a Segunda Guerra Mundial.

O poema "The Age of Anxiety" foi a base para uma sinfonia de Leonard Bernstein e o "Hymn to the United Nations" foi encomendado pelo Secretário Geral da ONU, U Thant. para ser musicado por Pablo Casals.

Com Leif Sjöberg Auden traduziu 66 poemas do sueco Pär Lagerkvist.

O poema "Victor" foi a base para canção do mesmo nome gravada pelo guitarrista Alex Lifeson, em1996.

Em 1949, após ler Kierkegaard e Reinhold Niebuhr, Auden retornou à fé anglicana da infância.
A posterior conversão ao catolicismo, influenciando seu trabalho, deu um certo nó na cabeça.
Passou a ver a sexualidade como um pecado que queria continuar a praticar. Costumava citar Santo Agostinho: “Faz-me casto Senhor, mas não agora”.


A religião particular que inventou envolvia protestantismo e catolicismo e, finalmente, se orientou pela teologia de Dietrich Bonhoeffer - imortalizado no poema Friday's Child - na qual a crença num Deus sobrenatural era vista como algo necessário no mundo moderno.



Quarto Movimento
Nos poemas da juventude havia uma fresca brisa revolucionária.


Uma linguagem exótica e telúrica alternava o banal e o elegante. Diagnosticava distúrbios psíquicos com uma grande competência, talvez por conhecer de perto as angústias de quem assume uma postura sexual firme e procura tratamento para suportar o tranco.


Esta busca acabou transcendendo o âmbito pessoal e transformou o poeta em voz de toda uma geracão oprimida pelo preconceito e perseguição. Produziu muita crítica literária e ensaios, assim como foi co-autor de romances, junto com seu amigo Christopher Isherwood, embora tenha sido, antes de tudo, um poeta.

Escreveu vilanelas, uma forma intrincada de poesia. É um pouco responsável pela introdução da métrica anglo-saxônica na poesia dos Estados Unidos.


Naturalizado norte-americano em 1946, voltou muitas vezes à Europa, veraneando na Itália e na Áustria.
Foi professor de Poesia na Universidade de Oxford de 1956 a 1961, o que só exigia um pouco de seu tempo, ocupando o resto em atividades literárias.

Durante seus últimos anos, vivia entre Nova York e Oxford. Morreu em Viena, na noite seguinte à última leitura pública daquela temporada (28/9/ 1973) e foi enterrado na casa de campo de Kirchstetten, Austria.



Uma Elegia em prosa

Elegia, poema terno e triste, lamentação pela perda de um personagem público, amigo ou parente querido é uma reflexão poética sobre a morte.


Repasso a vocês a URL deste artigo de Adam Gopnick, publicado pelo The New Yorker e traduzido por Pedro Lourenço Gomes.
http://www.gomestranslation.com/specialnews/auden.htm
Espero que, como eu, possam mergulhar num Auden dos dias finais, conhecer sua postura perante a sociedade, seus equívocos e acertos amorosos e entender porque é “um poeta indispensável em nossa época.”


Sugiro, meus leitores, que reflitam e percebam que também no caso de nosso moderno bardo inglês, ele mesmo tão freudiano, a espiral psicanalítica faz com que tudo que se foi acabe voltando, depois de transformar a energia e cumprir sua trajetória natural no tempo/espaço.


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Muito obrigada pelo comentário,Madu.Também acredito que a distância não separa mas, sim,pode refinar uma amizade como a nossa, de quase três décadas.

Este é de seus textos que li até agora o meu preferido. Clássico. Parabéns Maria Eduarda C Martins (distante mas sempre presente no pensamento)

Um comentário:

Henrique Dória disse...

Excelente o seu blog. Voltarei sempre. Beijos

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