sábado, 17 de agosto de 2019

Mulheres de Atenas-Pioneiras do Empoderamento Feminino



  Lysistrata, Aspasia, Corina e Sapho.
Na vida e na ficção elas fizeram a  diferença.      
                       

Lysistrata da “Guerra dos Sexos”, Aspasia de Mileto, Corina de Tanagra  e  Sapho de Lesbos - a primeira, personagem de Aristófanes e as demais atenienses  que conseguiram romper o espaço minimalista reservado às mulheres na Grécia da antiguidade.
Suas atitudes firmes inspiraram o movimento pacifista contra a guerra do Vietnã na década de 70 e  fizeram com que - em  março   de 2003 - artistas em redor do mundo  se unissem para protestar contra a violência diária, o terrorismo sem limite e as mortes desnecessárias causadas pela intolerância do governo Bush.


Situados na confluência da Europa e Oriente Médio, os gregos desenvolveram uma civilização que, dois mil anos depois, continua a enriquecer  o mundo.
Quanto às mulheres, eram contraditórios : veneradas, sob a forma de deusas em santuários, não tinham nenhum controle sobre seu destino na vida real. Passavam direto da ditadura paterna para a matrimonial e estavam, nos séculos VII a III aC,  apenas poucos degraus acima do status de escravo.
 As jovens não recebiam educação formal. Mesmo nas famílias ricas eram ensinadas apenas a cozinhar, fazer trabalhos domésticos e tingir tecidos.
Entre os mais  pobres, que não contavam com escravos, as mulheres faziam também trabalhos no campo.
No espaço do lar - rico ou humilde - sofriam segregação : não ocupavam a mesma ala da residência reservada aos homens.


Atuação na política, filosofia, literatura, poesia, pedagogia, incitação à transgressão e desobediência explicita às leis discriminatórias  foram os traços que uniram estas 4  lendárias figuras femininas.

Aspásia de Mileto

Nascida na colônia de Mileto imigrou para Atenas em 450 AC e ali viveu como estrangeira residente.
 Aspásia
Educada e hábil na arte de conversar e entreter, conheceu Péricles, o mais poderoso e prestigiado governante de Atenas mas não se casou com ele. Ironicamente, uma lei de sua autoria proibia relacionamentos com estrangeiros. Passou a viver como concubina ( pallakê ), até que Péricles se divorciou da primeira mulher. O casal teve um filho.
O relacionamento entre os dois  foi alvo de retaliação pela notória influência de Aspásia sobre a forma de Péricles governar. Embora tenha exercido a função de estratego durante 30 anos ( 460 a 430 aC), foi nesse período que Atenas atingiu o apogeu de sua vida política e cultural. Assim, o século V passou para a história como o “Século de Péricles”.
O status de estrangeira permitiu que Aspasia não ficasse confinada ao lar, podendo frequentar qualquer ambiente.
Mulher legítima e legitimada e - ao mesmo tempo - amante   recebia em seu salão literário amigos e admiradores que eram tratados com polidez e educação. Aspásia pensava, se mostrava, se exprimia.
Intelectual quando a norma exigia que a glória de uma mulher fosse a invisibilidade e o silêncio, companheira admirada e respeitada pelo marido. O grande filósofo Sócrates a admirava   pela “rara sabedoria política”, e “pelo grande número de atenienses que com ela  vinham aprender a arte da retórica”.   




Corina de Tanagra

Atenas foi a cidade irradiadora de cultura do mundo antigo, mas a literatura grega clássica, a história e a filosofia se concentraram numa época breve e em espaços claramente delimitados. 
Terminadas as grandes guerras, novas vozes se apresentaram, agora cantando o prazer do amor, as paixões, a vida e o vinho.
Assim era a poesia lírica (cantada ao som da lira) e uma notável representante do novo movimento foi Corina de Tanagra, também  sacerdotisa. Uma sacerdotisa na Grécia antiga exercia o cargo de conselheira das lideranças e atuava como juíza em tribunais que julgavam criminosos.
Corina foi mestra do célebre Píndaro e escreveu 5 livros de poesia ligeira, mas severa, daí seu apelido de “A mosca”.
 Em confrontos com grandes nomes das letras e artes, venceu 5 vezes os famosos concursos poéticos realizados em Tebas, num momento em que era vedada às mulheres a liberdade de expressão.

 Sapho de Lesbos
 
 Originária de uma família aristocrática da ilha de  Lesbos, Sapho viveu  na segunda metade do século 7 aC. e teve papel ativo nos negócios públicos de sua cidade, antes ser exilada para a Sicília.
Enquanto esteve casada com o riquíssimo Cercylas  teve uma fila a quem deu o  nome de sua mãe, Cleis.
Sapho se dedicou ao serviço das Musas e chegou a  conhecer, em  vida, a fama e o reconhecimento à sua poesia, a  seus cantos nupciais  e  a seus epigramas.
Depois de vivenciar  grandes mudanças internas, passou a ser discriminada, acusada de viver na marginalidade e de amar mulheres, entre elas Atthis, Télésippa e  Mégara.
Escreveu nove livros de poemas líricos.  As emoções fortes e atmosfera sensual que vinham de sua lira alimentaram o mito em torno de sua vida íntima, que vem provocando, desde a antiguidade, debates apaixonados  e profundos.    
Morreu ao se atirar ao mar do alto do rochedo de Leucates, por um amor não correspondido por um homem : Phaon, o Mitileniano.
 
Lysistrata e  a Greve de Sexo 

Uma das 40 obras escritas por Aristophanes ( 447 a 386 aC ), A Guerra dos Sexos foi  uma comédia revolucionária para seu tempo : os “heróis” eram belas mulheres. 
Lysistrata, figura central da trama, comandou as mulheres de Atenas e combinou com as mulheres de Esparta uma greve inusitada para forçar seus maridos a encerrar a Guerra do Peloponeso, que estava destruindo as duas cidades-estado.  
Quando voltavam das batalhas famintos de amor, as mulheres se recusavam a fazer sexo e assim,  os homens de Atenas e Esparta celebraram o tratado de paz.
Lysistrata  pede oportunidades maiores para o sexo feminino, argumentando que as mulheres também  possuem inteligência e juízo para tomadas de decisão políticas.
Consideradas propriedade, como os escravos - exceto para o sexo e multiplicação da espécie - as mulheres de Atenas souberam usar sua moeda de troca para comprar uma boa causa.
Se a Lysystrata que inspirou o autor existiu é uma pergunta sem resposta, mas o poder feminino que emana da obra de Aristófanes é inquestionável.

Comédia grega inspira ativistas : o Projeto Lysystrata

 Em  3 de Março de 2003, 500 cidades em diversos países como Argentina, Austrália, Áustria, Alemanha, Canadá, Republica Dominicana, Inglaterra, Italia, Escócia, Estados Unidos, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Islândia, Índia, Irlanda, Israel, Japão, Suíça, Síria e Turquia  levaram à cena em suas Universidades o espetáculo de Aristófanes.
A intenção dos criadores do Projeto  foi tentar diminuir a frustração com a  administração de George W Bush em relação ao Oriente Médio e instigar as pessoas, especialmente os estudantes, a  buscar a paz.
Marcie Staliare, que coordena o Projeto, declarou : “O tempo que estamos vivendo é confuso, mas como educadores acho que o maior poder que podemos delegar aos estudantes é a habilidade de pensar racionalmente e fazer suas próprias escolhas.Embora passada em outra época a peça nos coloca face a face com uma nova forma de ação, de comportamento e de sentimento. Mais do que tudo, a juventude de hoje precisa saber que existem alternativas e que ela pode  agir. Precisamos combater o medo”            
 “Antes de começar o Projeto Lysistrata não podíamos fazer nada além de assistir com horror o  que o governo Bush  fez nos ataques unilaterais ao Iraque. Então, criamos um website e começamos a contatar os amigos.A resposta ao nosso apelo tem sido enorme” A declaração é das atrizes norte-americanas Kathryn Blume e Sharron Bowers,  idealizadoras do Projeto.

Das bravas mulheres de Atenas  à  mais radical militante século do século 21  a atitude feminina  em busca da liberdade e  do reconhecimento  expressa uma vontade comum de  mudar a vida em geral e suas vidas em particular, redefinindo os fundamentos culturais e políticos da sociedade. 

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Visite o website do Projeto Lysistrata
 www.lysistrataproject.com.


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